sexta-feira, 29 de março de 2013

Pequenas mentiras, Grandes histórias

Bom dia! Seja bem vindo à Mitomania. Um espaço sem lugar. Depois da fronteira final. E onde tudo pode acontecer. Era uma vez... Não, não é assim que iremos começar. Só relaxem e sigam as linhas. Boa leitura!

Então isso foi o que aconteceu ao Jorge. Desde pequeno ele contava pequenas mentiras. Às vezes inocentes, às vezes tirava vantagens. Na escola, para cada dever de casa não entregue, uma boa e convincente narrativa de como o universo inteiro o impediu de cumprir essa sagrada tarefa. E ainda que muito se esforçasse, não poderia entregar o trabalho com a qualidade que desejaria, e que agradaria a sua professora. Logo isso começou a preocupar a professora e a mãe de Jorge.

A mãe dele não entendia o que estava acontecendo com o filho. Mas jamais permitiria que ele crescesse um mentiroso estúpido, e, por tanto, lhe aplicou um castigo um tanto inusitado. Todas as vezes que Jorge fosse pego contando uma mentira, seria obrigado a escrever a mentira contada, em cada detalhe. E depois numa outra redação, qual era a verdade.

Cada um dos textos era entregue à professora que deveria corrigir os erros de gramática e depois eram entregues à mãe de Jorge. Ela por sua vez obrigava o menino a pintar as bordas da folha onde estavam escritas as mentiras e depois prender as histórias no “Mural da Vergonha de ser um Mentiroso”. Onde ficariam por 3 meses. Depois do mural, as histórias eram colocadas na "Caixa da Misericórdia".

O Mural ficava convenientemente na frente da TV onde Jorge poderia jogar video game ou assistir desenhos. E o detalhe que mostrava o requinte de crueldade do castigo, a TV só seria revelada quando não houvessem mais mentiras para serem exibidas. Nas primeiras semanas o Mural ficou cheio rapidamente. Meses se passaram onde Jorge quase diariamente tinha que escrever longas redações, passá-las a limpo, depois pintar as bordas, colar no Mural. E tudo isso sem tv, ou jogos.
Passados mais alguns meses, suas notas haviam melhorado. Sua caligrafia e ortografia também. E o Mural começava a ter espaços vazios. De fato, Jorge parou de mentir tanto. Mas agora sua mente explodia com mil e uma histórias. Algumas tão fantásticas e maravilhosas que ele ficava até triste por que sabia que ninguém além dele iria conhecê-las.

Dois anos se passaram até aquela ideia aparecer. Não era exatamente uma ideia assim tão nova. Mas era uma forma de começar. Essas historias precisavam de um lugar e algumas delas mereciam ser conhecidas. E assim começou a mudança. Jorge passou a escrever suas historias preferidas fingindo que eram mais algumas de suas mentiras. passava para sua antiga professora do primário para que ela lesse e corrigisse cada uma. pintava dedicadamente as bordas e entregava a mãe que também lia sem desconfiar de nada. E cada vez que ele mentia para elas era um prazer inenarrável. Um outro passo radical foi quanto à Gaveta. Pegou cada uma de suas histórias. Releu com carinho, relembrando cada momento. E por fim selecionando cada uma das que gostava mais. E transcrevendo-as em volumes compilados do seu Diário Fantástico.

Mais alguns anos se passaram. Ironicamente, Jorge começou a trabalhar para o jornal de sua cidade fazendo pequenas matérias cotidianas. Sempre buscando a face mais clara e límpida da verdade. Enquanto ainda mantinha secretamente seu Diário. Mais alguns anos se passaram. Ele teve algumas promoções no jornal. Em uma das matérias entrevistou um roteirista de uma peça mambembe. Pessoalmente não achou que as peças apresentada tinham qualquer qualidade relevante. Mas enxergou uma oportunidade. Pegou os volumes do seu Diário. Com a ajuda de um colega do Jornal, transformou-os em dois livros. Enviou cópias a algumas editoras, e a alguns diretores e roteiristas que havia conhecido na sessão de artes e cultura.
Logo veio a primeira resposta positiva: transformar um dos seus contos em uma peça infantil. E então quem estava de mãos dadas com a ironia era o universo. Ao procurar saber qual história seria contada na peça ouviu o nome de uma mentira que ele nunca contou. “Sobre como um mentiroso começou esse Livro”

Divirtam-se e até um futuro próximo;